Silksong chegou e, depois de cerca de três horas jogando, já estou afogado — no melhor sentido possível. É aquele tipo de sequência que te puxa pra dentro sem cerimônia, encurta a parte inicial intimidadora do antecessor e abre caminhos ramificados rápidos o suficiente pra você começar a explorar com confiança. Dá pra sentir desde o começo que é o mesmo DNA de Hollow Knight, só que mais refinado: menos fricção desnecessária, menos “a deixa pra mais tarde” que frustrava, e mais opções táticas na sua mão. Quem curte montar builds e testar limites vai se lembrar do que é ficar horas quebrando a cabeça com possibilidades. E quem prefere só aproveitar a viagem? Também tem espaço pra isso. Não seria ótimo equilibrar tudo isso sem perder a identidade do jogo original?
“Hollow Knight é um Metroidvania com um poço de conteúdo para descobrir tão profundo quanto suas cavernas labirínticas. O mundo de Hallownest é envolvente e rico, cheio de história para você descobrir por conta própria, e construído com caminhos ramificados que oferecem uma quantidade absurda de escolha em como você vai descobri-lo. Com tanta densidade de segredos para encontrar e inimigos desafiadores e divertidos para enfrentar, vale a pena passar todo o tempo que puder em Hollow Knight.” – Tom Marks, 21 de junho de 2018
A personagem mudou — e isso muda a vibe
A primeira coisa que salta aos olhos é Hornet não ser a protagonista muda que o original tinha. Ela fala. Tem personalidade. E isso tem impacto direto na narrativa e na exploração. Não é fala o tempo todo tipo NPC de RPG genérico — é algo pontual, cheio de atitude: confiante, reservada, direta quando necessário. Preocupava-me que isso quebrasse a atmosfera silenciosa e misteriosa que tanto definiu Hollow Knight, mas Hornet consegue ser direta sem se tornar caricata. O tom ainda é sóbrio, com espaço pra outros personagens brilharem mais. Resultado: diálogos mais claros quando o jogo precisa explicar algo, mas ainda tem espaço pra descobertas silenciosas.
E claro: as escritas continuam excelentes. Há um equilíbrio entre poesia e humor que faz com que momentos mais sérios e gags bobas coexistam sem perder o ritmo. Um dos meus trechos favoritos já é um pilgrim cantando pra uma porta, achando que a canção abriu o caminho — até você achar a alavanca. Precisa ter humor numa direção só? Não. Silksong sabe dosar.
Customização mais estratégica — isso funciona?
O sistema de personalização é uma das mudanças mais técnicas e interessantes. Charms (ou amuletos) agora são codificados por cor — isso força escolhas: você vai aumentar a quantidade de moeda que os inimigos largam, ou prefere pegá-la automaticamente quando cai? Essas decisões são mais do que cosméticas; elas afetam como você explora rotas e quais riscos vale a pena correr. Além disso há um ataque secundário (até agora, uma adaga rápida de arremesso) e Crests que alteram drasticamente sua forma de atacar — quase como trocar de arma.
Esse modelo abre espaço pra construir estilos de jogo coerentes, e é exatamente o que eu queria ver em uma sequência técnica como essa. Ao mesmo tempo, existe o risco clássico: muitas escolhas que parecem profundas mas, no fim, só criam caminhos óbvios que todo mundo prefere. Se o balanceamento ficar bem calibrado, Silksong pode suportar builds radicalmente diferentes; se não, muita escolha vai virar ilusão.
O que me anima é que os primeiros sinais apontam pra um bom trabalho de tuning: há trade-offs claros, e itens que te forçam a priorizar. Isso deixa as decisões importantes no centro da experiência — e pra quem gosta de experimentar, a recompensa está em testar combinações e ver o que realmente funciona.
Silksong não está para brincadeira; ele pune e também te oferece ferramentas para não te massacrar por completo.
Sobre a dificuldade: morrer tem peso. Você perde tudo — as Rosaries, a nova moeda — e tem que retornar ao local da morte pra recuperar. Mas há mitigadores inteligentes: consumíveis que permitem guardar um pouco da moeda, opções para diminuir a perda logo cedo e a decisão de não amarrar absolutamente tudo a esse único recurso. Isso reduz aquela frustração gratuita que o original às vezes gerava e incentiva exploração mais agressiva quando você se sentir preparado.
A mecânica de mapa também recebeu atenção. No jogo antigo, a curva de aprendizado do mapa era um dos fatores que afastavam jogadores — você podia perder o mapa por um tempo e só atualizá-lo depois de voltar na cidade. Agora, os upgrades de mapa aparecem mais cedo no fluxo natural do jogo, justamente antes das áreas começarem a abrir. Resultado: menos tropeços iniciais, menos volta inútil à cidade só pra atualizar um mapa, e ainda assim aquela tensão gostosa de explorar uma área sem saber onde tudo está.
E a música? Já dá pra sentir que vai ficar na cabeça por bastante tempo. A trilha prediz o clima das zonas e sustenta bem a atmosfera de exploração e confronto.
Quer dizer então que tudo é perfeito? Não exatamente — são só primeiras impressões. Ainda não tenho a visão completa de como todas as mudanças de habilidade e upgrades vão se entrelaçar lá pela metade ou pelo fim do jogo. Mas o que está no lugar já aponta pra um trabalho que não se limita a não quebrar o que era bom: ele aprimora.
A indicação de tamanho do jogo pelos speedrunners também é curiosa: a meta de 100% agora é em menos de 30 horas, contra 20 do primeiro. Isso pode indicar um mundo maior ou simplesmente mais conteúdo espalhado. De qualquer forma, é um sinal de ambição.
Pra quem curte desafio técnico e otimização: como isso afeta a experiência competitiva e de speedrun será uma discussão rica nos próximos meses. Para o jogador casual, as mudanças de usabilidade ajudam a reduzir atritos sem tirar a essência de explorar e descobrir. E você — prefere um jogo que te empurra pro limite ou um que te deixa modular a própria dificuldade? É possível ter os dois?
No meu caso, já me peguei várias vezes fechando o texto só pra jogar mais. Ainda tem muito pra descobrir, muito pra testar e muito pra criticar — e isso é ótimo. Team Cherry não reinventou a roda, mas tratou cada aspecto do jogo com a atenção necessária para que nada pareça deixado ao acaso. Se o resto do jogo mantiver esse nível de polimento, Silksong tem tudo pra não só cumprir as expectativas, mas superar boa parte delas. E eu mal posso esperar pra voltar pro jogo e ver até onde esse novelo de opções e segredos vai me levar.