Call of Duty Black Ops 7 muda campanha tradicional e aposta no co-op para quatro jogadores

Call of Duty Black Ops 7 abandona a campanha single-player tradicional, focando em co-op e live service, refletindo mudanças no mercado e no comportamento dos jogadores.
Escrito por:
Lucas Amaral

Sem sombra de dúvida, Call of Duty sempre foi sinônimo de multiplayer — a fama veio com o PvP explosivo do Modern Warfare original e desde então a franquia virou uma máquina de milhões. Mesmo assim, ano após ano a Activision continuou investindo rios de grana em campanhas single-player. Cresci em Half-Life e Halo; foram esses modos narrativos que me prenderam em COD desde o começo. Mas este ano a conversa muda: Black Ops 7 vem pregando a cartilha do “co-op”, pensado para quatro jogadores desde o início. E isso levanta a pergunta que nenhum fã quer ouvir: será que o single-player clássico do COD chegou ao fim?

A primeira coisa que salta aos olhos é que Black Ops 7 não é uma campanha tradicional reaproveitada para multiplayer — é um modo feito ao redor da lógica de um esquadrão humano. Isso tem consequências diretas no design: acabaram-se as sequências cinematográficas roteirizadas que definiram a identidade do Call of Duty; sumiram também as ideias experimentais daquele Black Ops 6 que tantos elogios recebeu ano passado. Em vez disso, o que sobra são fases pensadas para tiroteios em coridoras e chefões que engolem balas — encontros onde múltiplos humanos jogando juntos fazem mais sentido do que um jogador sério querendo imersão na história. Black Ops 7 não funciona direito sozinho; tentar jogá-lo sem esquadrão vira experiência frustrante.

A mecânica mudou. Inimigos com barra de vida, números de dano exibidos, armas coloridas por níveis e caixas de loot transformaram-se em linguagem de loot-shooter. É o tipo de ajuste que faz armas deixarem de ser “coisas que você pega de inimigos derrotados” para virarem “itens de saque encontrados em baús”. E o mapa aberto de Avalon, que aparece com frequência antes de se tornar sua base para o tal Endgame, está cheio de objetivos menores e atividades que lembram Warzone, Destiny ou até Helldivers. Você sente que está num universo onde a narrativa passou para segundo plano — o cerne agora é a repetição de loops de atividade e progressão.

O Endgame é o verdadeiro pivô desta mudança. Depois de 11 missões, o modo se revela como um 32-player PvE que será atualizado ao longo do tempo — um “quase live service” preso à embalagem do single-player, que com o tempo pode se desprender totalmente. Atente: já existe plano de permitir que jogadores “pulem” as missões e vão direto para Avalon. Isso não é especulação; em entrevista à IGN, Miles Leslie, diretor criativo associado, disse: “No dia um, queremos garantir que as pessoas progridam para [Endgame] de forma natural. Queremos que elas passem pela história, entendam o mundo, as habilidades, os personagens. [Mas] o que já discutimos é que, em algum momento, e ainda não definimos quando exatamente, quando ele se desbloqueia para todo mundo?” — Miles Leslie, diretor criativo associado (Raven/Treyarch, em conversa com a IGN). A mensagem é clara: a narrativa serve mais como tutorial emocional do que como objetivo final.

Esse reposicionamento acompanha um dado que ninguém pode ignorar: as campanhas curtas atraem percentuais de conclusão irrisórios. No PlayStation, apenas 5% dos jogadores desbloquearam o troféu de conclusão da campanha do Black Ops 6; no Modern Warfare 2 de 2022 esse número sobe apenas para 8%; e no reboot de 2019, para 12,6%. Esses números não mentem: a maior parte do público de Call of Duty simplesmente não está investindo tempo para jogar a campanha sozinho, mesmo quando ela é bem feita e bem financiada. Diante disso, faz sentido do ponto de vista financeiro e estratégico repensar para quem as campanhas devem funcionar.

Historicamente, Treyarch sempre teve interesse em co-op. Desde World at War (2008), a ideia de inserir co-op no pacote single-player já aparecia — às vezes parecendo “algo encaixado”. Black Ops 3 foi um experimento maior: missões rejogáveis em qualquer ordem, quase como escolher mapas de multiplayer, mas isso fragilizou a narrativa. Em Black Ops 4 a campanha foi completamente descartada para investir tudo em Blackout, o primeiro passo real de COD em battle royale. Pode-se argumentar que o movimento de 2018 antecipou essa tendência: o estúdio já tentou transformar o pacote em algo centrado no online.

E a influência do multiplayer já marcou outras entradas da franquia. Modern Warfare 3 (2023), mesmo sem co-op, foi criticado por reciclar sensibilidade de battle royale: missões desenhadas para jogadores acostumados com Warzone, uso de trechos do mapa Verdansk nas fases. Black Ops 7 segue nessa trilha, até reaproveitando mapas de multiplayer (alô, Skyline do Black Ops 6) como cenário de campanha. Isso não é acidente — é economia de recursos e um reflexo do que o público mais demanda hoje.

Mas será que essa transformação é necessariamente ruim? Depende do que você espera de Call of Duty. Se seu formato ideal é uma experiência solo, roteirizada, com sequências memoráveis e ritmo pensado para uma só cabeça, então a mudança corta direto no que te atraiu. Por outro lado, para quem vive no online, curte progression loops, loot e modos persistentes que te prendem por meses, a direção faz sentido comercial e de engajamento. Com o jogo cada vez mais identificado como produto de serviço ao invés de obra fechada, a Activision está remodelando o DNA da campanha tradicional.

No plano técnico e de design, há sacrifícios claros. Scripts que antes geravam momentos cinematográficos e set pieces memoráveis deram lugar a encontros genéricos e previsíveis. A IA fica reduzida — afinal, o jogo foi pensado para múltiplos humanos que vão cobrir lacunas narrativas com conversa e risadas. A necessidade de não pausar partida, a possibilidade de ser kickado por inatividade, são elementos expirados de experiência solo. Além disso, balanceamento de inimigos com barra de vida e chefes tanque favorece a dinâmica co-op, não o desafio tenso e pessoal que definia missões icônicas como “All Ghillied Up”.

Quem consome jogos no Brasil sente essa mudança de forma prática: um conteúdo pensado para ser cooperativo e vivo ao longo do tempo casa muito bem com Game Pass, com servidores cheios e com jogadores buscando atividades semanais. No mercado brasileiro, onde muitos jogadores já conhecem e amam modos multiplayer e battle royale — e onde o tempo disponível entre trabalho, estudos e vida social é escasso —, jogos que entregam recompensas contínuas e objetivos curtos tendem a gerar mais engajamento. Será que isso explica por que a maioria dos jogadores brasileiros pula a campanha e vai direto pro online? Provavelmente. Mas isso não apaga a frustração de quem queria experiências single-player consistentes.

Comparando com outros jogos, o que Black Ops 7 tenta é um híbrido que já deu certo em títulos que priorizam co-op e progressão: Destiny, Borderlands, Left 4 Dead e, claro, Warzone. Esses jogos mostraram que loops de saque, progressão e atividades de curto prazo conseguem milhões de jogadores ativos por longos períodos. Call of Duty, como franquia anual com orçamentos monstruosos, agora parece mirar em algo similar: transformar a “campanha” em uma porta de entrada para um serviço que retém jogadores mensais. Não é uma ideia maluca do ponto de vista de retenção e receita — é só que muda radicalmente o que a palavra “campanha” significava para fãs veteranos.

A dúvida que fica é sobre a continuidade dessa direção. A franquia ziguezagueia: em 2023 vimos a campanha mais ambiciosa desde Infinite Warfare (2017) e, em 2025, eis a reviravolta. Em 2026 espera-se o próximo jogo da Infinity Ward — ele pode voltar a experimentar com clássicos de narrativa, reciclar elementos de Warzone ou abrir outra porta ainda. Call of Duty tem essa natureza anual: testes, recuos e tentativas. Mas o presente é claro: a Activision está avaliando o significado da marca para uma geração que prefere conteúdo social, sempre online e com recompensas contínuas.

Então, o que isso significa para quem ainda quer single-player no COD? Há três trajetórias possíveis. Uma é a manutenção de campanhas tradicionais em alternância com anos focados em multiplayer/co-op (um estúdio faz uma, outro faz outra). Outra é a transformação permanente: campanhas se tornam modos cada vez mais parecidos com serviços ao vivo. A terceira é um meio-termo, onde existem campanhas, mas elas incorporam mais elementos de co-op sem perder seus beats narrativos — um desafio de design gigante, mas não impossível. A pergunta é: o público quer isso? Quer campanhas com componente co-op sem perder a alma narrativa? Ou prefere, de uma vez por todas, aceitar que COD é basicamente multiplayer?

Para quem desenvolve jogos, a equação é técnica e comercial. Orçamentos altíssimos demandam retorno; se a maioria joga só o multiplayer, faz sentido investir onde o público está. Mas a paixão por campanhas single-player é real e profunda. É uma questão de risco: sacrificar singularidade narrativa por retenção pode manter franquia rentável, mas também corrói parte da identidade que a tornou icônica. E como consumimos jogos no Brasil — onde Game Pass, Xbox Series X, PC e uma cena multiplayer vibrante dominam — essa tensão fica ainda mais evidente.

No fim das contas, Black Ops 7 funciona como estudo de caso — uma peça de evidência de uma tendência maior. A pergunta “o single-player morreu?” não tem resposta definitiva, mas se olharmos para números, custos e a mentalidade do mercado atual, a tendência é clara: campanhas como as conhecemos são cada vez mais raras e caras de justificar. Isso não garante que elas sumam totalmente — haverá sempre estúdios e audiências que as defendam — mas é razoável esperar que o formato se torne uma exceção, não a regra.

Acho que vale perguntar diretamente: você quer que Call of Duty mantenha campanhas tradicionais, com a mesma pegada cinematográfica de antes, ou prefere que a franquia evolua para modos cooperativos e serviços persistentes que prendem você por meses? É uma questão de gosto, mas também de prioridades econômicas da indústria. E no Brasil, onde a comunidade Multiplayer é forte e o consumo de conteúdo ao vivo cresce, essa mudança tende a encontrar espaço.

No balanço final, Black Ops 7 é um aviso e um experimento: aviso de que o mercado mudou e experimento para ver se a nova receita social segura a atenção dos jogadores como antes. Quem curte campanha solo pode se sentir traído; quem vive do online pode achar que a franquia finalmente está alinhada com o presente. O que vem a seguir — mais tradição ou mais live service? — só o calendário anual dirá. Mas uma coisa é certa: Call of Duty está avaliando o próprio futuro, e nós, jogadores, teremos que decidir se queremos acompanhar essa metamorfose.