Game Pass faturou US$5 bilhões, diz Pete Hines, mas ameaça estúdios sem apoio

A conversa sobre serviços de assinatura como o Xbox Game Pass virou assunto quente — e não por causa só da conveniência para jogadores. Para quem acompanha os bastidores da indústria, a preocupação é outra: esses serviços podem parecer um paraíso para quem joga, mas podem estar corroendo a sustentabilidade do desenvolvimento de jogos se não houver equilíbrio entre a plataforma e quem produz o conteúdo.

“Assinaturas se tornaram a nova palavra de quatro letras, certo? Você não pode mais comprar um produto”, disse Pete Hines, ex-vice-presidente sênior de marketing e comunicações globais da Bethesda, que se aposentou em 2023 após 24 anos na empresa. “Se você não descobrir como equilibrar as necessidades do serviço e de quem roda o serviço com as pessoas que estão fornecendo o conteúdo — sem o qual sua assinatura não vale nada — então você tem um problema real”, completou Hines, deixando claro que, mesmo fora da companhia, observou decisões que julga de curto prazo. Você já parou pra pensar como o modelo afeta quem realmente cria os jogos?

O argumento principal é simples e técnico: um serviço de catálogo precisa de fluxo constante e previsível de conteúdo de alta qualidade. Para garantir isso, é preciso reconhecer corretamente o trabalho de criação — não apenas pagar um fee pela inclusão no catálogo, mas estruturar contratos, royalties, métricas de sucesso e suporte a longo prazo. Se o desenvolvedor não for devidamente valorizado, o ecossistema entra em colapso. Uma assinatura que não incentiva produção sustentável acaba valendo pouco para todo mundo.

No mercado, a discussão ganhou volume desde o lançamento do Game Pass em 2017. A Microsoft informou que o serviço gerou US$5 bilhões em receita no último ano, anúncio que veio logo depois de demissões em massa na área de jogos. É uma sinalização contraditória: receita alta para a plataforma, pressão crescente sobre quem desenvolve. Shawn Layden, ex-chefe da PlayStation, também já alertou sobre os riscos do modelo: “A ideia do ‘Netflix dos jogos’ é um perigo; me deixa questionando… isso é saudável para o desenvolvedor?”

Casos recentes ilustram o risco prático. Em maio de 2024, Arkane Austin (responsável por Redfall) e Tango Gameworks (Hi-Fi Rush) foram fechadas; a Tango foi posteriormente resgatada pelo publisher Krafton, mas a ruptura expôs a fragilidade de estúdios dentro de um ecossistema dominado por grandes serviços. Raphael Colantonio, fundador original da Arkane, foi direto ao ponto: “O Game Pass é o elefante na sala e um modelo insustentável. Não acho que o GP possa coexistir com outros modelos; ou ele mata todo mundo, ou desiste.”

Então qual é a saída prática? Como analista e jogador que curte shooters competitivos e avaliação técnica, vejo dois caminhos claros: contratos que alinhem riscos e recompensas (royalties baseados em engajamento real, bônus por metas de retenção, cláusulas de suporte pós-lançamento) e transparência das plataformas sobre métricas e decisões de curadoria. Sem isso, a economia do desenvolvimento vira loteria — e ninguém quer depender da sorte quando se fala em centenas de pessoas trabalhando por anos.

No fim das contas, a pergunta que fica é direta: queremos um catálogo barato e sempre novo, mesmo que isso signifique menos estúdios independentes sustentáveis, ou preferimos modelos que equilibrem lucro da plataforma e saúde do estúdio? Se você trabalha com desenvolvimento, joga pesado ou só quer saber se as suas franquias favoritas vão sobreviver, essa é a discussão que vai definir os próximos cinco anos da indústria.